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Direitos da pessoa com obesidade ainda carecem de aplicação

Especialista em Direito Médico Sandra Franco detalha legislação que ampara direitos da pessoa com obesidade, mas aponta obstáculos para implementação

André Derviche Carvalho

1 de ago de 2022 (atualizado 7 de ago de 2022 às 17h20)

“Se não houver a efetividade da ação, temos uma lei que não serve para nada”. É assim que a especialista em Direito Médico Sandra Franco contextualiza o panorama dos direitos da pessoa com obesidade no Brasil. Hoje, situações de discriminação no ambiente de trabalho já existem, mas poderiam ser evitadas com o cumprimento de lei que existem há pelo menos 20 anos.

Nesse sentido, a lei 10.048 do ano 2000 foi precursora ao garantir, por exemplo, condições de acessibilidade a pessoas com obesidade em prédios públicos. Anos mais tarde, em 2015, um inciso ao artigo 7º da Constituição Federal também buscou agir em prol do combate à estigmatização da pessoa com obesidade ao proibir “qualquer prática discriminatória e limitativa” para efeito de acesso ou manutenção por motivo de deficiência. Naquele mesmo ano, uma lei federal incluiu a obesidade como deficiência.

Porém, o dia a dia da pessoa com sobrepeso coloca todo esse amparo garantido pela lei à prova. Em 2016, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) foi condenada a pagar R$ 100 mil a um candidato desclassificado de um concurso público por apresentar condição de obesidade. Na época, seu IMC era de 31,1 kg/m². Mesmo entendendo que a eliminação não configurou discriminação, a Justiça do Trabalho condenou a CPTM por danos morais.

Contudo, a reparação nem sempre acontece. Em 2018, a 8ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou indenização por danos morais a uma mulher com obesidade demitida de um hospital. O judiciário entendeu que “embora seja grave, a obesidade não provoca estigma ou preconceito no meio social, principalmente porque não é contagiosa nem gera necessariamente sinais de repulsa nos seus portadores”, segundo apontou a Revista Consultor Jurídico. A ex-empregada aguardava autorização para a realização de cirurgia bariátrica.

O estigma sobre a obesidade

“Estamos falando de uma doença que traz uma discriminação e uma segregação na sociedade. Há uma gordofobia que deve ser observada” aponta Sandra Franco destacando que a obesidade é uma das únicas doenças que traz uma responsabilização do paciente. Vale lembrar que a não discriminação no exercício da medicina é um dos princípios fundamentais presentes no Código de Ética Médica (CEM).

Leis e normas existem também para garantir a existência de equipamentos capazes de suportar pessoas com níveis mais elevados de obesidade, como o acima de 40 kg/m², em sistemas de saúde. Porém, em live do Painel Brasileiro da Obesidade (PBO), Sandra lembrou de casos em que um exame não pôde ser realizado em um paciente com obesidade pela falta de equipamento adequado: “Chegou um momento em que o paciente não sabia em qual lugar ele poderia ser atendido”, revela.

Do ponto de vista legal, o cidadão com obesidade que sofrer práticas discriminatórias pode procurar o Ministério Público. No caso específico de problemas com planos de saúde, Sandra também indica que buscar a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon) e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) são caminhos viáveis. Contatar vereadores e atores políticos é também uma saída para fomentar o debate sobre pautas que garantam os direitos da pessoa com obesidade.

Cenário da obesidade

No Brasil, o sobrepeso pode atingir 68% da população adulta até 2030, segundo o estudo “A Epidemia de Obesidade e as DCNT – Causas, custos e sobrecarga no SUS”, realizado por uma equipe de pesquisadores de diversas universidades do Brasil e uma do Chile. “É uma questão multifatorial. Temos um ambiente propício para desenvolvimento da obesidade, em razão de uma alimentação inadequada e do apelo ao sedentarismo. Isso faz parte de uma responsabilidade de toda a sociedade”, afirma Sandra.