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Acontece no PBO

Ministério da Saúde destaca atendimento multiprofissional da obesidade

Working paper do Painel Brasileiro da Obesidade (PBO) analisou as principais tendências presentes nas linhas de cuidado da obesidade no Brasil

André Derviche Carvalho

21 de jul de 2022 (atualizado 7 de ago de 2022 às 17h20)

Um problema global que se agrava no Brasil. Essa pode ser uma das várias formas de definir a obesidade. Afinal, mais de um quinto (22%) da população brasileira enfrenta essa doença, o que está a nove pontos percentuais da média global (13%). Diante disso, materiais para direcionar o cuidado da obesidade em sistemas de saúde são encontrados em abundância e ajudam a revelar tendências de tratamento. Nesse sentido, três dos principais documentos produzidos pelo Ministério da Saúde indicam o atendimento multiprofissional para a doença.

Esse cenário foi constatado no working paper “Comparativo entre diretrizes de Linhas de Cuidado de Pessoas com Sobrepeso e Obesidade”, elaborado pelo Painel Brasileiro da Obesidade (PBO). O objetivo do material foi analisar os principais manuais instrutivos de cuidado da obesidade dos últimos cinco anos. São esses documentos que norteiam as linhas de cuidado a adultos com obesidade e sobrepeso no Brasil. Assim, a pesquisa busca verificar os principais componentes das linhas de cuidado dessa doença.

O que são linhas de cuidado da obesidade?

As linhas de cuidado nada mais são do que padronizações dos fluxos assistenciais da pessoa com obesidade, podendo ser compostas pela prevenção, tratamento e reabilitação dos indivíduos que sofrem com esse quadro. Cinco documentos, que vão desde os mais gerais, como as Diretrizes Brasileiras de Obesidade, de 2016, até os mais específicos, como o Manual de Atenção às Pessoas com Sobrepeso e Obesidade no âmbito da Atenção Primária à Saúde (APS), de 2021, foram analisados.

O Manual da APS é acompanhado do Manual de Diretrizes para o Enfrentamento da Obesidade na Saúde Suplementar Brasileira, de 2017 e do Instrutivo de Abordagem Coletiva para Manejo da Obesidade no SUS, de 2021, no grupo dos documentos ligados ao Ministério da Saúde. Dentre eles, os três propuseram a atuação de equipes multiprofissionais no cuidado da obesidade.

Os dados são importantes de serem revelados, uma vez que, no Brasil, ao menos até 2019, cerca de 150 milhões de pessoas dependeram do sistema público de saúde, representado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Nele, a atenção à saúde é hierarquizada em níveis primário, secundário e terciário. Cada um podendo contribuir à sua maneira para a reversão de quadros de obesidade.

O atendimento multiprofissional da obesidade

A tendência de recomendar atendimento multiprofissional no cuidado da obesidade vai ao encontro do que já preconizam os especialistas. “Devido à sua complexidade, o cuidado de pessoas com sobrepeso e obesidade tende a ser menos efetivo quando feito por apenas um único profissional da área da saúde. Para que haja maior efetividade na atenção à saúde é fundamental o apoio de uma equipe multiprofissional”, apontou o working paper

Junto a isso, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), aponta que as necessidades individuais dos usuários definem quais profissionais estarão envolvidos no seu planejamento terapêutico. Nesse contexto, o endocrinologista, o cirurgião bariátrico, o nutricionista, nutrólogo, psicólogo, enfermeiro são alguns dos profissionais que podem estar envolvidos na composição multidisciplinar das equipes de cuidado.

Uma das formas de se estabelecer atendimento multiprofissional nas linhas de cuidado da obesidade é por meio das Práticas Integrativas e Complementares à Saúde (PICS), uma vertente que “que indica a utilização de práticas complementares e racionalidades médicas alternativas ao sistema clínico e comunitário”, segundo o working paper. Porém, essas práticas só se encontram presentes em 17% dos municípios brasileiros, sendo oferecidas principalmente na APS. Mesmo assim, vale mencionar que “ainda há na literatura uma inconsistência quanto aos efeitos terapêuticos das PICS tanto na obesidade quanto para o tratamento de outras doenças crônicas”, o que exige mais pesquisas sobre o assunto.

As principais linhas de cuidado da obesidade

A variedade de formas de se cuidar da obesidade faz jus à complexidade da doença, que já é encarada como multifatorial. Por essa razão, também é importante identificar quais as principais linhas de cuidado para a pessoa com obesidade, o que também foi realizado no working paper. Promoção da alimentação adequada e saudável, prática de atividade física, incentivo da ação de equipes multidisciplinares, abordagens comportamentais, além do tratamento medicamentoso e a intervenção cirúrgica surgiram como as principais medidas sugeridas por órgãos brasileiros de referência no tratamento da pessoa com obesidade e sobrepeso.

Porém, nem todos os materiais apresentam exatamente as mesmas linhas de cuidado. Como alternativa para convergir as soluções propostas, o material do PBO sugere o incentivo ao debate entre as instituições, bem como a avaliação da possibilidade de padronização e atualização destes instrutivos.

Obesidade e os sistemas de saúde

Ainda no campo da multifatorialidade, é importante lembrar que a obesidade é uma doença que promove alterações no metabolismo e no comportamento do corpo. Assim, ela pode diminuir a qualidade e o tempo de vida do paciente, sobrecarregar o sistema de saúde e reduzir a produtividade da força de trabalho. Por isso, há uma busca pelas ações mais efetivas para a redução de peso no indivíduo com quadro de obesidade e sobrepeso.

Estabelecer linhas de cuidado para tratar dessa doença é um processo que exige a convergência dos sistemas de saúde regional, municipal e/ou estadual. “É preciso delimitar quais ações serão implementadas de acordo com as demandas mais relevantes da população, considerando aspectos socioeconômicos, organizacionais e operacionais de cada território, além de especificações importantes decorrentes de cada alteração ou doença”, destaca o working paper.

Esse cuidado também aparece na legislação. O working paper destacou cinco portarias do Ministério da Saúde, de 2013 a 2020, que garantem às pessoas com sobrepeso e  obesidade acesso aos serviços de saúde bem como aos cuidados de alta complexidade.

Os cuidados multiprofissionais da obesidade

De volta à análise das normativas das linhas de cuidado, o material do PBO identificou três esferas principais de assistência ao paciente com obesidade: vigilância alimentar e nutricional (exemplos: avaliação do consumo alimentar e apoio ao autocuidado); planejamento terapêutico (exemplos: assistência terapêutica integral e propostas de mudança de estilo de vida) e acompanhamento (exemplos: verificação da adesão ao tratamento e seguimento do paciente e garantia de acolhimento adequado das pessoas com sobrepeso e obesidade em todos os setores da atenção).

Cada instrutivo apresentou uma série de ações voltadas às linhas de cuidado da obesidade. A promoção da alimentação saudável e a prática de atividades físicas apareceram em todos os documentos analisados. Essas são medidas úteis para mudar padrões de alimentação não saudáveis e interromper o sedentarismo, respectivamente. Abordar a obesidade por meio do atendimento multiprofissional, porém, foi uma proposição limitada aos três documentos do Ministério da Saúde.

Obesidade e estigmatização

Com relação ao fator de estigma que ainda afeta muitos indivíduos com obesidade, ficou constatado que os instrutivos não priorizam seu combate. “A linguagem ‘people-first, que coloca a pessoa e não a doença em primeiro plano, no sentido de reduzir o estigma do peso, modificar a relação entre o paciente e sua condição e aumentar a chance de o indivíduo buscar assistência em saúde, não foi utilizada nesses instrutivos”, apontou o working paper.

Tratar do comportamento do indivíduo, inclusive, é outra tendência notada nas linhas de cuidado à obesidade no Brasil. “A abordagem comportamental aparece como possibilidade no manejo do indivíduo com sobrepeso e obesidade em três dos documentos avaliados”, aponta o material do PBO citando atividades como apoio psicológico, entrevista motivacional, terapia cognitivo-comportamental e escuta empática.

O uso de remédios no cuidado da obesidade

Enquanto isso, o tratamento medicamentoso da obesidade também se apresenta como uma opção. Desta vez, em dois dos instrutivos observados. O manual da ANS, por exemplo, coloca como meta a perda de 10% do peso corporal a partir da abordagem medicamentosa. Os fármacos em questão, contudo, nem sempre são especificados nos materiais analisados.

Por fim, o working paper se propôs a analisar outros dois instrutivos, desta vez internacionais (um canadense e outro europeu) sobre linhas de cuidado à obesidade. Na maioria dos aspectos, eles demonstraram consonância com os materiais brasileiros. Para saber mais detalhes, acesse o material do PBO.

Com isso, ficou claro que ainda faltam consensos sobre como cuidar da obesidade no Brasil. Isso foi provado por certas divergências entre os instrutivos analisados. Ainda assim, uma análise como a que foi realizada serve para estabelecer as tendências já consolidadas como o atendimento multiprofissional. sendo importante para o planejamento de políticas públicas. “O debate entre as instituições deve ser incentivado para a troca de experiências, propiciando elementos mais direcionados para o estabelecimento das linhas de cuidados de acordo com as regiões e territórios”, aponta o material.